Intervenção José Correia
Membro do Conselho Nacional
Reforçar a autonomia do Poder Local – a luta das 35 horas
Camaradas e Amigos,
Em primeiro lugar, uma saudação fraterna a todos, certo de que tudo faremos em defesa do Emprego com Direitos, da Soberania e do Progresso Social, como afirma o feliz lema deste nosso XIII Congresso.
O Poder Local Democrático, cujo quadragésimo aniversário sobre as primeiras eleições autárquicas livres assinalamos este ano, foi uma das maiores conquistas da democracia saída da Revolução de Abril e um elemento central na sua consolidação e afirmação, contribuindo de forma ímpar para a recuperação do atraso infraestrutural do País promovendo alterações económicas e sociais profundas e marcando o rumo da descentralização democrática do Estado.
Um Poder Local Democrático que, tal como a Constituição consagra, implica a existência de órgãos próprios, eleitos democraticamente, agindo em total liberdade face a outros, apenas com submissão à Constituição, às leis, aos tribunais em sede de aplicação dessas mesmas leis e ao povo, sendo portanto inaceitáveis e ilegais quaisquer intervenções destinadas a controlar o mérito, a conveniência ou a oportunidade da actuação autárquica; a existência de atribuições e competências próprias, recursos técnicos, humanos e financeiros adequados.
É este Poder Local, inseparável das suas características democráticas, que tem sido alvo de ataques consecutivos por parte de sucessivos governos ao longo dos últimos 39 anos.
Uma ofensiva agravada brutalmente nos últimos quatro anos e que sob os mais diversos pretextos: o combate ao défice, a redução das despesas públicas, as imposições da troika expressas nas medidas do Governo PSD/CDS-PP, que pretendeu transformar as autarquias em meros instrumentos de concretização das políticas da administração central, reduzindo drasticamente a sua capacidade de realização e intervenção.
Um ataque que, em última análise, integrou o processo de exploração, empobrecimento, limitação democrática e saque fiscal imposto aos trabalhadores.
A longa lista de ataques ao poder local e à sua autonomia é encabeçada pela criminosa extinção de freguesias, 1168 no total, a que os municípios escaparam por razões tácticas, medida que, em simultâneo com o encerramento de serviços públicos de proximidade, aprofundou assimetrias e acentuou a desertificação do interior do País.
Entretanto, avançou-se com uma falsa «descentralização», por via da qual se pretende «municipalizar» importantes funções do Estado, como a Educação, Saúde e Segurança Social, sabendo de antemão que os municípios não têm recursos financeiros nem experiência para assegurar estas funções por esta via.
Centralizou-se e concentrou-se a gestão da água e do saneamento, privatizou-se os resíduos, e retirou-se competências aos municípios na fixação dos preços e tarifas destes serviços, para garantir os lucros de futuros operadores privados.
Com a «Lei dos Compromissos e Pagamentos em Atraso», as autarquias foram colocadas sob a vigilância apertada do Governo e os municípios em dificuldades financeiras obrigados a aumentar impostos, taxas e tarifas para os valores máximos como condição para terem acesso a empréstimos.
O Governo impôs a extinção de centenas de empresas municipais, com base em critérios meramente financeiros, não olhando aos postos de trabalho nem à continuidade dos serviços prestados às populações.
As receitas municipais recuaram uma década. A despesa global foi cortada em 20%, com as maiores reduções nas despesas de investimento e de pessoal.
A par deste gigantesco retrocesso, o Governo PSD/CDS impôs a redução obrigatória do número de trabalhadores levando a que, entre 2010 e 2015, tenham sido destruídos cerca de 25 mil postos de trabalho, a que se somaram as restrições à contratação de novos trabalhadores e à diminuição de cargos dirigentes. Ao mesmo tempo que congelou e cortou salários, promoveu-se a contratação de milhares de desempregados através dos chamados contratos de emprego e inserção (CEI), verdadeira escravatura dos tempos modernos.
Chantageou e bloqueou ilegalmente a contratação colectiva na administração local, impedindo designadamente a publicação de mais de 600 Acordos Colectivos de Empregador Público (ACEP), livremente negociados entre as autarquias e o STAL, por consagrarem a manutenção das 35h/semanais, sem banco de horas e a adaptabilidade de horários, violando mais uma vez grosseiramente a autonomia local.
Foi neste quadro de violenta ofensiva anti-laboral e anti-social que os trabalhadores da administração local, unidos em torno do seu sindicato de classe, o STAL, resistiram e nunca viraram a cara à luta contribuindo para a derrota do Governo PSD/CDS e da sua política.
De forma consequente e determinada protagonizámos o combate histórico em defesa das 35 horas semanais, sem bancos de horas e adaptabilidades, luta de que saímos vitoriosos, como o Acórdão 494/15 do Tribunal Constitucional confirmou, uma decisão histórica e uma afirmação da dignidade constitucional do Poder Local, comprovando que vale sempre a pena lutar.
Aliás, há muito se sabia que o Governo PSD/CDS perdera esta luta. Uma luta que dura há pelo menos 960 dias, pela reposição de um direito que custou muito a conquistar e que prossegue com a assinatura de acordos em defesa das 35 horas em todos os locais de trabalho, sem quaisquer mecanismos de flexibilidade. Reafirmamos pois que o direito às 35 horas tem que ser um direito para todos os trabalhadores, do sector público e privado, e que apesar de consolidado na administração local é necessário que essa reposição ou conquista seja feita sem qualquer mecanismo de flexibilidade ou de tratamento desigual entre trabalhadores.
A redução do horário de trabalho sem perda de remuneração esteve e estará sempre na linha da frente da reivindicação e da luta por uma vida melhor porque ela é uma condição necessária à valorização humana dos trabalhadores.
Em resultado das eleições legislativas do passado dia 4 de Outubro, há hoje um novo quadro político que tem condições para inverter, como refere a nossa proposta de Projecto de Acção, "o caminho de reconfiguração do Estado e de destruição dos direitos dos seus trabalhadores". É pois urgente retomar o caminho do reforço e valorização do Poder Local, autónomo e democrático, valorizar os seus trabalhadores, como elemento inseparável do desenvolvimento, da coesão social e da democracia.
É neste sentido, que continuaremos a lutar, dia a dia, nos locais de trabalho, com os trabalhadores, com as populações e com eleitos locais, por uma política que tenha como objectivos a valorização e dignificação dos trabalhadores, a defesa do poder local democrático e de serviços públicos de qualidade para todos, exigindo prioritariamente,
No plano da defesa da autonomia do poder local e dos serviços públicos de qualidade:
- Respeito pela autonomia política, administrativa e financeira das autarquias locais, com o cumprimento da Lei das Finanças Locais que já retiraram às autarquias mais de 300 Milhões de Euros, a revogação da "Lei dos Compromissos" e o fim do exercício de tutelas de mérito que violam a CRP.
- Reforço do carácter democrático das autarquias e das suas competências.
- Criação das Regiões Administrativas.
- Recuperação financeira das autarquias, bem como o exercício pleno por estas das suas competências, nomeadamente na gestão dos trabalhadores;
- Rejeição dos processos de municipalização de funções sociais na área da saúde e educação, na observância do princípio de responsabilidade do Estado e da igualdade de acesso.
- Defesa do direito à água e o reforço e a valorização das competências municipais na prestação dos serviços públicos de água, saneamento e resíduos, exigindo a reversão da privatização da EGF e do processo de fusões das empresas de águas.
- Uma gestão pública democrática, participada, transparente e orientada para a satisfação das necessidades e o bem-estar das populações.
No plano das condições de trabalho:
- Descongelamento do sistema de progressões e discussão de um sistema de carreiras que respeite as funções, responsabilidades e conhecimentos;
- Descongelamento dos salários e negociação anual de aumentos salariais de acordo com as propostas da CGTP e da Frente Comum;
- Combate à precariedade, particularmente aos mais de 30.000 Contractos de Emprego e Inserção colocados nas autarquias, e integração de todos os trabalhadores que desempenham funções permanentes;
- 35 horas semanais de trabalho para todos e revogação de todas as cláusulas que agravam e flexibilizam os limites dos tempos de trabalho;
- Reposição dos valores e compensações do trabalho suplementar, incluindo o prestado em dias descanso e feriados e outras prestações remuneratórias.
- Regulamentação das condições de trabalho prestado em condições de insalubridade, penosidade e risco e de outros suplementos, caso da isenção de horário, piquete e disponibilidade;
- Promoção e valorização da contratação colectiva;
- Actualização da remuneração complementar nas Regiões Autónomas;
São estes os nossos compromissos e é com a força dos trabalhadores, com a força deste grande e solidário colectivo que é a CGTP, que nos bateremos por eles.
Viva o XIII Congresso da CGTP-IN!
Vivam os trabalhadores!
Almada, 26 e 27 de Fevereiro de 2016