Assegurar o emprego e os salários – Reforçar o papel do estado – Desenvolver o país

abandeirascgtpPosição da CGTP-IN sobre as medidas de resposta à situação actual

1. INTRODUÇÃO: ACTUAR NO PRESENTE SALVAGUARDANDO O FUTURO

Vivemos hoje tempos de grande exigência. Não podemos dizer que tudo advém de um factor externo (um vírus). A duração e a magnitude da crise dependem crucialmente das respostas. Desde logo na saúde. Mas também no emprego, nos rendimentos e nos apoios à actividade económica. O surto iniciou-se mais tarde em Portugal, o que ainda aumenta o grau de exigência nas respostas necessárias.

Não podemos minimizar a situação vivida. O Serviço Nacional de Saúde (SNS) encontra-se sob pressão. A dedicação e empenho dos profissionais de saúde tem sido notável, mesmo quando muitos carecem das condições adequadas ao exercício das suas funções. Milhares de portugueses estão confinados; uma parte da economia encontra-se paralisada e muitos trabalhadores perderam os seus empregos.

A extensão e, sobretudo, a natureza dessas respostas moldam não só o presente mas também o futuro pós-pandemia. Temos de actuar no presente salvaguardando o futuro.

Os riscos são enormes. Temos de ser intransigentes no respeito integral dos direitos fundamentais dos trabalhadores e de outras camadas da população. Se o não fizermos a democracia ficará em risco. Mas podemos sair da crise reforçados num rumo para uma sociedade mais coesa, com um Estado cimentado nas suas diferentes dimensões, com trabalho com direitos e um perfil produtivo que dê resposta às necessidades dos trabalhadores e do povo. Estas são, entre outras, condições essenciais para o desenvolvimento do país.

· A crise revela as fragilidades do país

Diz-se hoje que não estamos, nem podíamos estar, preparados. É só meia-verdade. Porque podíamos e devíamos estar melhor preparados. Podíamos ter um SNS mais forte se não fosse sacrificado a políticas de redução do défice público. Confrange que, em submissão à União Europeia, nem agora o Governo compreenda que melhor do que um excedente de 0,2% nas contas públicas de 2019 seria o reforço do SNS nos últimos anos.

A crise revela as nossas forças, desde logo o empenhamento dos profissionais da saúde e dos que garantem bens e serviços essenciais, mas também expõe a nu as vulnerabilidades. A CGTP-IN nunca deixou de valorizar avanços sociais na anterior e já nesta legislatura com algumas medidas positivas aprovadas no Orçamento do Estado para 2020. Mas nunca deixou de salientar insuficiências e lutou contra retrocessos, como ocorreu com a revisão da legislação laboral.

A CGTP-IN sempre exigiu aos sucessivos governos, e também ao Governo actual, mudanças estruturais de política assentes no trabalho com direitos, no reforço das funções sociais do Estado e na reconversão do tecido produtivo. O Primeiro-Ministro descobre hoje que afinal Portugal pode produzir bens de que não dispõe. É bom que o faça, mas este reconhecimento não pode ser circunstancial e teria sido melhor que tivesse apostado, desde 2016, numa política de substituição de importações, o que até consta do Programa do Governo desse ano. Hoje estamos numa crise com uma economia assente em baixos salários, precariedade e baixas qualificações; com serviços públicos debilitados por anos de política de direita e pelas políticas de “consolidação orçamental”; fortemente dependente do turismo (cujos efeitos de retracção podem não ser de curto prazo); sem investimento público (tem sido negativo em termos líquidos); e com uma bolha imobiliária especulativa que pode estar em vias de rebentar (no período de 2016 a 2019 os preços da habitação tiveram um aumento médio anual de 9.1%). Acresce uma revisão da legislação de trabalho que criou novas formas de precariedade e manteve a caducidade das convenções colectivas.

A epidemia não pode ser justificação para suspender os direitos fundamentais. Preocupa o uso da palavra “guerra” porque perspectiva soluções autoritárias; a própria afirmação de que "a democracia não foi suspensa" tranquiliza menos do que ameaça. A CGTP-IN opõe-se à suspensão do direito de greve em certas actividades, que considera desnecessária e desproporcionada. Não há razões que a justifiquem, nem é compatível com o princípio da não suspensão da democracia.

· As medidas urgentes

No presente documento, a CGTP-IN pronuncia-se sobre a crise em curso e sobre as medidas de resposta, as tomadas e as que considera necessárias.

Primeiro, a CGTP-IN converge na (felizmente) generalizada opinião de que a resposta no plano da saúde constitui a primeira prioridade, sendo crucial alargar a capacidade de resposta do SNS. Desta resposta depende a duração da epidemia e, portanto, a duração da crise nos diversos planos, incluindo no económico. A CGTP-IN valoriza a resposta do SNS à pandemia, o empenhamento de todos os seus profissionais, muitas vezes com risco da própria vida, e o reforço que tem sido feito dos seus meios, mesmo que os considere ainda insuficientes. Para a população é hoje ainda mais claro o papel do SNS, que tanto tem sido atacado pelas forças de direita. Esta valorização, a importância do SNS e, no geral, da intervenção do Estado, é uma das grandes lições a retirar da crise.

Segundo, é imperativo salvaguardar o emprego e o rendimento dos trabalhadores. Como mostraremos neste documento, as medidas tomadas pelo governo não o asseguram. Há trabalhadores que estão a ser despedidos, sendo os mais vulneráveis os que têm vínculos precários (849 mil em 2019). O governo continua a recusar a medida de proibição de todos os despedimentos, como reclama a CGTP-IN.

É inaceitável o desequilíbrio entre as medidas que estão a ser colocadas à disposição das entidades patronais e as que estão à disposição dos trabalhadores, com a agravante de, num quadro em que os recursos são escassos face às necessidades, o Governo estar a direccionar os apoios concentrando-os nas grandes empresas, incluindo empresas multinacionais, que, na sua larga maioria, têm não só condições para aguentar o embate da retracção da actividade económica, como devem mesmo ser chamadas a contribuir de forma robusta para o esforço colectivo que estamos a empreender. Empregando 30% dos assalariados, o governo destina-lhes o grosso dos apoios, o que é injusto para as micro, pequenas e médias empresas (MPME), e é totalmente inconcebível num quadro de equidade social.

O regime chamado de “lay-off” simplificado, que foi alargado para responder às exigências do patronato, representa um corte salarial, não proíbe de facto os despedimentos, fragiliza a relação de trabalho, penaliza a Segurança Social e tem efeitos económicos recessivos. A manutenção do emprego e dos rendimentos é uma necessidade, não apenas para os trabalhadores afectados, mas para a própria economia: permite aguentar o consumo ou limitar a sua quebra (o Banco de Portugal prevê -4,8% no cenário mais adverso); e evita que se destrua mão de obra qualificada, como na crise anterior. Se não forem tomadas medidas, pode-se materializar a projecção do Banco de Portugal que aponta uma redução do emprego de 5,2% e uma taxa de desemprego de 11,7%.

Terceiro, impõe-se o reforço e não o debilitamento das funções sociais do Estado, desde logo a saúde e a Segurança Social. As medidas tomadas vão ter um forte impacto na Segurança Social, nas receitas (as contribuições ainda subiram 7,4% em Fevereiro) e nas despesas. Só o “lay-off” simplificado implica um acréscimo de despesa mensal de mil milhões de euros, segundo o governo.

São positivas, mas limitadas, algumas das medidas tomadas como o prolongamento de prestações sociais. Mas outras não o são, como o “lay-off” simplificado, quando se prevê a isenção de pagamento das contribuições patronais. A CGTP-IN condena medidas que prevejam a isenção total ou parcial de pagamento de contribuições, mesmo que sejam financiadas pelo Orçamento do Estado, bem como quaisquer adiamentos no pagamento destas mesmas contribuições. A epidemia revela, uma vez mais, que o governo usa a Segurança Social como mero instrumento de política económica, pondo em causa um direito fundamental e uma sustentabilidade financeira que tanto tem apregoado.

Defende-se, em quarto lugar, uma fiscalização apertada da legislação de trabalho porque o surto pandémico não pode ser usado como desculpa para a violação dos direitos dos trabalhadores (despedimentos, férias forçadas, etc). A Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT) continua sem os meios humanos e técnicos necessários.

Em quinto lugar, as medidas de resposta à recessão económica prevista devem dar prioritariamente resposta às MPME, pois são as mais afectadas.

Em sexto lugar, impõe-se total transparência, a publicação de estatísticas sobre o impacto da crise aos seus vários níveis, o acompanhamento das medidas pelos sindicatos e a avaliação das medidas. A CGTP-IN vê com preocupação que possa ser afectada a produção de estatísticas pois estas são essenciais para medir os impactos económico-sociais da pandemia.

A resposta à crise sanitária por parte da União Europeia (UE) está muito aquém da resposta necessária aos trabalhadores e aos povos e está a ser determinada pelos interesses das grandes potências e dos grupos económicos. O que se exige é que se mobilize mais verbas (os países mais ricos devem contribuir mais, pois são os que beneficiam com a integração europeia), sem retirar dinheiro de outros fundos, a não ser os que se destinam a políticas securitárias, militaristas, de intervencionismo externo e propaganda, não se ficar apenas pela antecipação das verbas atribuídas a título dos fundos estruturais e de coesão, mantendo as condicionalidades e a comparticipação nacional; pôr fim às condicionalidades na utilização dos fundos estruturais e de investimento e a sua reafectação no apoio aos sectores mais atingidos pela quebra da actividade económica, no apoio as MPME dos sectores mais atingidos; teria de revogar o Pacto de Estabilidade e o Tratado Orçamental, assim como os condicionalismos da governação económica; teria de evitar o aumento dos juros da dívida pública; impulsionar a cooperação entre os países; promover o progresso social e evitar os erros do passado em que impôs uma infame política de exploração e empobrecimento.

A presente situação revela de forma crua as limitações que o euro introduz no direito do País. A CGTP-IN reafirma a necessidade de medidas de soberania monetária que assegurem o seu desenvolvimento económico e social.

2. DEFENDER O EMPREGO, ASSEGURAR OS RENDIMENTOS. COMBATER A VAGA DE DE “LAY-OFFS”

· Defender o emprego: travar a vaga de despedimentos, de extinções de postos de trabalho e da não renovação de contratos a termo

Estamos hoje perante uma vaga de despedimentos, de extinção de postos de trabalho e da não renovação de contratos a termo; do despedimento durante o período experimental; o aumento dos despedimentos colectivos; o despedimento de trabalhadores em trabalho temporário; muitos verdadeiros trabalhadores independentes tiveram uma paragem total ou significativa da actividade desenvolvida, enquanto muitos falsos trabalhadores independentes, que são de facto trabalhadores por conta de outrem, perderam o emprego; há também perdas de emprego na chamada economia informal, cujas actividades foram forçadas a cessar.

Pesa sobre os trabalhadores abrangidos por “lay-offs” a ameaça de que a suspensão dos contratos de trabalho ou a redução da duração do trabalho se possa converter mais tarde em despedimentos. O regime de “lay-off” simplificado não garante plenamente o princípio da manutenção do emprego, havendo empresas que já “despediram” os trabalhadores com vínculos precários antes mesmo do recurso à medida.

Muitos trabalhadores foram forçados a “gozar” as férias e as instituições que gerem creches e infantários já anunciaram, como se duma verdadeira garantia se tratasse, que estarão abertas em Agosto.

É ainda cedo para se dispor de uma avaliação global da situação, mas vale a pena recordar que as projecções económicas mais recentes do Banco de Portugal apontam, no cenário mais severo, para uma taxa de desemprego de 11,7% este ano. A taxa de desemprego situou-se em 6,5% em Janeiro (valor provisório).

Só a proibição dos despedimentos, independentemente do vínculo laboral do trabalhador, travará o volume de trabalhadores que, ou já perderam os seus empregos, ou estão em risco de que tal possa ocorrer nos próximos meses, com o risco de perda total ou substancial do seu rendimento, em resultado de medidas de combate à epidemia.

· Assegurar as remunerações integrais dos trabalhadores

A continuidade do recebimento da remuneração integral por parte dos trabalhadores é uma exigência de que a CGTP-IN não abdica, não só para que se possa fazer face a uma situação em que os assalariados e as suas famílias incorrem em mais despesas, mas também como garante que a normalização da economia ocorre a um ritmo mais rápido, de forma mais justa, evitando-se no presente os erros do passado recente, em que quem trabalha e trabalhou pagou (e continua a pagar) os custos da crise.

Os trabalhadores e as suas famílias vivem uma situação excepcional. Numa altura em que a recuperação de rendimentos empreendida a partir de finais de 2015 não é suficiente para alterar a realidade dos baixos salários, da pobreza laboral que afecta um em cada dez trabalhadores, em que o salário médio é insuficiente para garantir um nível de “rendimento adequado” que permita uma vida digna no nosso país, os trabalhadores estão confrontados com um acréscimo significativo das suas despesas mensais, quer seja por via do aumento dos consumos domésticos, seja ainda por encargos acrescidos no plano da saúde, isto num contexto em que as despesas fixas (electricidade, água, gás, rendas, comunicações...) se mantêm ou até aumentam. A redução, na totalidade ou parcialmente, dos rendimentos do trabalho, implica um abaixamento das condições de vida que, em muitos casos, são já precárias.

Por outro lado, os dados até agora divulgados, nomeadamente pelo Banco de Portugal mas não só, são claros a indicar que a profundidade, duração e amplitude da situação recessiva, dependerá em grande parte do investimento público e do consumo privado. Num quadro em que se prevê a contracção da procura externa dirigida ao nosso país, em que os principais parceiros comerciais se encontraram também em recessão, em que o investimento público está num nível baixíssimo, pelo que mesmo um aumento considerável partirá sempre de uma base diminuta, em que o investimento privado, num quadro de recessão, será adiado, é do consumo privado, do poder aquisitivo de quem trabalha e trabalhou, que depende em grande medida a forma e rapidez com ultrapassaremos a recessão económica.

A garantia das retribuições por inteiro dos trabalhadores é ainda uma questão de justiça social. Num país que continua marcado por elevados níveis de desigualdade, nomeadamente na repartição da riqueza entre o trabalho e o capital, em que recentemente os rendimentos e direitos do trabalho foram massacrados, aumentando a exploração para garantir os privilégios do capital, não podemos repetir uma receita geradora de uma profunda crise económica e social, da qual só paulatinamente e de forma muito condicionada, estávamos a sair.

As verbas necessárias para garantir esta exigência da CGTP-IN, cujo montante é ainda incerto e está dependente da duração do combate à epidemia, têm de ter origem numa reafectação da distribuição do rendimento nacional, ou seja, numa transferência de rendimentos do capital para o trabalho, ainda que nesta fase inicial uma parte dos rendimentos possa ter que ser assegurada pelo Orçamento do Estado. A CGTP-IN identifica um conjunto vasto de medidas, que envolvem verbas muito consideráveis, que nos permitem afirmar que há dinheiro. Fruto da opção de classe do Governo, continuam a ser drenados milhares de milhões de euros para o grande capital. É dinheiro que faz falta para que a larga maioria da população possa ver as suas condições de vida melhoradas e de que o país precisa para se desenvolver. A presente situação é, assim, uma oportunidade para promover uma maior justiça social, em si indutora do desenvolvimento.

· Regime de “lay-off” representa um corte nos salários

Entre as medidas tomadas e anunciadas de apoio às empresas (linhas de crédito, moratórias, incentivo financeiro extraordinário para apoio à normalização da actividade da empresa, antecipação dos pedidos de pagamento dos fundos estruturais), sobressai o regime chamado de “lay-off” simplificado, que já foi apelidado de mãe de todas as medidas. Este regime, na sua forma digamos normal, não é desconhecido da realidade portuguesa. Mas o regime agora criado, devido à dimensão que assume e às muito facilitadas condições de acesso, não é comparável com o anterior. A CGTP-IN destaca cinco aspectos: o elevado número de trabalhadores que podem vir a ser abrangidos; o corte salarial; o baixo grau de protecção dos trabalhadores contra despedimentos; o elevado custo para a Segurança Social; o efeito económico recessivo. Tudo isto agravado pela secundarização do papel e promoção de uma participação muito ténue por parte das estruturas representativas dos trabalhadores.

O regime de “lay-off” não é novo, mas o recurso à medida pelas empresas foi sempre diminuto excepto em 2009. Mesmo neste ano, o número de trabalhadores foi inferior a 20 mil. No ano passado foram abrangidas 154 empresas e cerca de 4 mil trabalhadores.

O Governo admite que o novo regime possa abranger 1 milhão de trabalhadores, um valor que representa 35% dos trabalhadores declarados nos Quadros de Pessoal de 2018. Os dados mais recentes, divulgados a 6 de Abril pela Ministra do Trabalho, da Solidariedade e da Segurança Social, indicam que já recorreram a este regime mais de 33 mil empresas as quais empregam 567 mil trabalhadores. A diferença de escala impossibilita a comparação entre os regimes, o normal e o simplificado, nomeadamente quanto aos seus impactos laborais, sociais e económicos.

O novo regime também não é comparável quanto ao seu acesso. Este acesso, particularmente a definição de crise empresarial (artigo 3º), é alargado e simplificado ao extremo. As entidades beneficiárias “podem ser fiscalizadas” (itálico nosso) e pode (idem) ser requerida a apresentação de documentos económicos comprovativos. A informação a prestar aos delegados sindicais e comissões de trabalhadores é mínima (artigo 4º) na medida em que apenas se prevê que sejam “ouvidos”, não especificando de que forma, sobre que aspectos e em que prazos.

A medida representa o regresso a uma política de cortes salariais. O argumento de que este corte já se verificava no anterior regime não é válido porque se poderia optar por outra medida, ou por um regime diferente adequado a uma situação de excepção. O corte é significativo porque o trabalhador recebe 2/3 da retribuição normal ilíquida com um valor limite de 3 salários mínimos (1905€).

Acresce que no fim da aplicação da medida, as empresas ainda vão ter um apoio financeiro à retoma da actividade, suportado pelo IEFP, pago de uma só vez, com o valor de um salário mínimo por cada trabalhador.

O regime também não assegura a protecção contra os despedimentos que seria exigível numa situação tão excepcional como aquela que estamos a viver. O governo, na sequência da denúncia feita pela CGTP-IN, corrigiu um dos aspectos mais gravosos do Decreto-Lei 10-G/2020, de 26 de Março, que previa que a proibição de despedimentos se aplicava apenas aos trabalhadores abrangidos pela medida. Apesar disso, continua a deixar na disponibilidade dos empregadores várias modalidades de cessação dos contratos de trabalho, nomeadamente a caducidade, a dispensa no período experimental e o despedimento por inadaptação; por outro lado, continua também a ser possível o empregador despedir livremente (dentro do permitido pelas regras legais previstas no Código do Trabalho), após terminado o curto período em que vigora a proibição de despedir (no total pode ir até um máximo de 5 meses).

A Segurança Social é fortemente lesada, devido ao pagamento de uma parte substancial da retribuição e da isenção de pagamento das contribuições sociais patronais. Este custo pode ser elevado. O Governo admite um acréscimo adicional de mil milhões de euros (MM€) por mês, pelo que o custo total pode ascender a 3 MM€.

A medida não deixa de ser penalizadora para a Segurança Social pelo facto de o financiamento ser assumido pelo Orçamento Estado (OE) (artigo 16º). Este artigo apenas se refere à contribuição retributiva da responsabilidade da Segurança Social, embora a perda de receita resultante da isenção contributiva estabelecida deva também ser compensada nos termos da lei do financiamento da Segurança Social. Mas não se perdia nada em estabelecer no diploma esta obrigação. A questão de fundo é, porém, a de que o sistema não deve financiar esta despesa.

A epidemia revela, uma vez mais, que o Governo usa a Segurança Social como mero instrumento de política económica pondo em causa um direito fundamental e uma sustentabilidade financeira que tanto tem apregoado.

A utilização massiva do “lay-off” simplificado vai ter um efeito económico recessivo. O corte salarial, aliado aos despedimentos e à não renovação de contratos a termo, nomeadamente, vai implicar a diminuição do rendimento com efeito no consumo. Nas projecções do Banco de Portugal sobre o período 2020 a 2022 admite-se, no cenário mais adverso, uma quebra no consumo privado de 4,8% este ano e uma redução do PIB de 5,7%. Seria, pois, imperativo o recurso a medidas que impedissem a concretização deste cenário.

O Governo tem um vasto leque de medidas para apoiar as empresas desde linhas de crédito, que de resto foram aprovadas, a subsídios reembolsáveis. Aposta, no entanto, na criação de um novo e quase desregulado regime, que põe o Estado a pagar o grosso dos salários, representa um corte salarial, não proíbe os despedimentos, acarreta um encargo enorme para a Segurança Social e tem efeitos económicos recessivos.

A informação de que já se dispõe indica o recurso ao “lay-off” simplificado por empresas que têm condições económicas para não usarem os apoios concedidos ao abrigo deste regime. Empresas como a FNAC, H&M, Primark, Decathlon, o Grupo Sheraton, Ritz, Grupo Pestana e Vila Galé, a Visteon, Gestamp ou a Renault Cacia, o Grupo Barraqueiro ou a Portway do Grupo Vinci, entre tantas outras, que apresentaram lucros de milhões de euros, estão na lista das empresas que recorreram já à medida. O dinheiro que falta para apoio aos trabalhadores e às MPME, é assim apropriado pelos detentores dos grandes grupos económicos.

A CGTP-IN defende o direccionamento dos apoios para as MPME e a introdução de regras restritivas para que uma grande empresa beneficie de apoios, reservando esta possibilidade apenas quando comprovadamente os apoios se revelarem determinantes e o último recurso para a manutenção da actividade, devendo as empresas apoiadas ressarcir o Estado das ajudas concedidas antes de distribuírem quaisquer dividendos ou outro tipo de remuneração do capital.

Para a CGTP-IN, a manter-se o recurso a esta medida, o regime deveria ser profundamente alterado de modo a: impedir qualquer corte retributivo; proibir em absoluto todas as formas de despedimento, mantendo assim todos os postos de trabalho, independentemente do vínculo e suspender a caducidade dos contratos a termo; efectivar o exercício dos direitos de informação e de consulta das estruturas representativas de trabalhadores na empresa no que respeita à aplicação da medida; revogar a norma sobre a isenção de contribuições para a Segurança Social; criar mecanismos eficazes de fiscalização das empresas.

3. MEDIDAS DIRIGIDAS ÀS FAMÍLIAS E FORMAS ALTERNATIVAS DE TRABALHO

A entrada progressiva na actual crise ligada à epidemia de Covid-19, foi provocando todo um conjunto de abruptas alterações no funcionamento de empresas e outras entidades, agravadas pela declaração de Estado de Emergência em 18/03/2020 pelo Presidente de República.

Do encerramento voluntário de empresas, estabelecimentos e serviços, passou-se ao encerramento obrigatório de grande parte da actividade económica, com excepção das actividades consideradas essenciais. Multiplicaram-se as situações de isolamento profiláctico, de assistência à família, teletrabalho, entrada em “lay-off” e, não raras vezes, os trabalhadores foram simplesmente afastados dos locais de trabalhos sem que qualquer informação lhes fosse dada, quer sobre a duração do encerramento, quer sobre o pagamento das suas retribuições.

A resposta governamental a estas e outras situações, na opinião da CGTP-IN, pautou-se por insuficiente, tendo incidido nas seguintes medidas:

· Medidas de protecção social na doença e na parentalidade

Estas medidas incluem a equiparação do isolamento profiláctico à situação de doença, garantindo o direito a um subsidio pago pela Segurança Social, correspondendo a 100% da remuneração de referência e cujo pagamento não está sujeito a verificação do prazo de garantia.

Prevê-se também um subsídio de assistência a filho e a neto para as situações em que o menor haja sido objecto de decisão de isolamento profiláctico. De referir que esta medida só abrange criança menores de 12 anos, ou, independentemente da idade, com deficiência ou doença crónica. A CGTP-IN tem vindo a denunciar o facto de não estarem abrangidos, pelo menos, os menores até aos 15 anos de idade.

Foi adoptada igualmente uma outra medida, intitulada de “apoio excepcional à família para trabalhadores por conta de outrem”, concretamente para os casos decorrentes da necessidade de acompanhamento de menores, devido ao encerramento dos estabelecimentos de ensino e de outros equipamentos destinados à guarda de crianças, embora com muitas limitações. Desde logo, o facto de não prever o pagamento de 100% da retribuição aos trabalhadores que têm de cuidar de filhos ou netos, na medida em que prevê apenas o pagamento de 2/3 da remuneração base, paga em partes iguais pela Segurança Social e pela entidade patronal.

Por outro lado, o trabalhador só pode aceder a este apoio quando não seja possível a prestação da sua actividade em regime de teletrabalho, o que demonstra que, para o legislador, um trabalhador em regime de teletrabalho está sempre disponível para acompanhar os seus filhos ou netos menores de 12 anos, independentemente da idade ou dos cuidados de que necessita.

A este respeito, sublinha-se que a Segurança Social também tem negado o apoio quando o outro cônjuge está em regime de teletrabalho. O que é inaceitável.

Outra das limitações graves deste regime diz respeito ao facto de o apoio não incluir o período das férias da Páscoa, pelo menos para as crianças entre os 3 anos e os 11 anos, na medida em que esses estão abrangidos pelo calendário escolar que determina os períodos de funcionamento dos estabelecimentos de educação pré-escolar e do ensino básico e secundário.

Recentemente, o governo veio alterar o regime original, determinando o alargamento das faltas justificadas às situações de ausência ao trabalho para prestar assistência aos filhos também no período de férias escolares e, ainda, à necessidade de prestar assistência aos ascendentes, inicialmente não contemplada.

Relembra-se que esta medida foi alcançada por grande pressão e insistência da CGTP-IN, que desde a primeira hora reivindicou (e continua a exigir) estes alargamentos como fundamentais para a melhor protecção dos direitos dos trabalhadores e das respectivas famílias.

Porém, o Governo não cedeu no que respeita ao alargamento da atribuição do apoio extraordinário também nestas situações, o que significa que os trabalhadores que necessitem de faltar ao trabalho por este motivo vão ficar numa situação muito vulnerável, devido à redução dos seus rendimentos neste período particularmente penoso e difícil da vida de todos nós.

O Governo também não prevê qualquer apoio no que respeita à situação dos ascendentes, concretamente os que são objecto de medidas de isolamento profiláctico, os que fazem parte de grupos de risco, ou os que, dependendo de ajuda de terceira pessoa, foram afectados por encerramento de centros de dia e outras instituições de apoio à 3ª idade.

· Formas alternativas de trabalho

Uma outra linha de resposta à situação causada pela presente crise tem a ver com a imposição da obrigatoriedade de prestação da actividade em regime de teletrabalho, quando tal seja possível, tendo em conta as funções prestadas pelos trabalhadores abrangidos.

A entrada do trabalhador em teletrabalho pode ser determinada de forma unilateral pela entidade patronal, ou requerida pelo trabalhador, contudo, a regulamentação tem limitações no que respeita ao pagamento de determinadas componentes da remuneração dos trabalhadores. Essa problemática teve o seu auge com a troca de posições públicas relativamente ao pagamento do subsídio de refeição durante o período de teletrabalho. Neste período algumas entidades públicas – como a CCDR Norte – emitiram pareceres que defendiam o não pagamento desta prestação, situação que, com a denúncia da CGTP-IN foi clarificada em favor dos trabalhadores. Contudo, este tipo de problemas, alarga-se também a outras prestações como a isenção de horário, subsídio de transporte, subsídios de disponibilidade, etc., cujo pagamento as entidades patronais não querem garantir em caso de teletrabalho.

Outra das preocupações manifestadas pela CGTP-IN, tem a ver com as garantias do trabalhador relativamente às condições de trabalho de que deve usufruir. Quer do ponto de vista das condições de Saúde e Segurança no Trabalho (SST), quer quanto ao cumprimento dos horários de trabalho, intervalos para descanso, etc., é fundamental obrigar as entidades patronais a assumirem as responsabilidades que a lei lhes atribui.

Existem problemas com o teletrabalho que, a médio e longo prazo, se farão sentir, como sejam o esforço económico de manutenção que se transfere da empresa para o trabalhador (renda, luz, água, internet) e o esforço na harmonia familiar e pessoal do trabalhador, tendo como mesmo local o posto de trabalho e a sua casa. Exige-se que o recurso ao teletrabalho tenha um carácter extraordinário e que findo este surto epidémico todos os trabalhadores possam regressar ao local de trabalho.

Tendo em consideração o atrás referido, a CGTP-IN propõe:

1. Alargar o “apoio excepcional à família para trabalhadores por conta de outrem” aos períodos de férias escolares e abrangendo as crianças até aos 15 anos, garantindo que as crianças afectadas pelo encerramento dos estabelecimentos de educação e ensino não ficam numa situação de desprotecção;

2. Alargar o “apoio excepcional à família para trabalhadores por conta de outrem” à prestação de assistência aos ascendentes que são objecto de medidas de isolamento profiláctico, os que fazem parte de grupos de risco, ou os que dependem de ajuda de terceira pessoa;

3. Determinar que os apoios previstos para as várias medidas de assistência à família garantam o pagamento de um montante correspondente a 100% da remuneração dos trabalhadores;

4. Alargar a atribuição dos apoios para assistência à família, mesmo nos casos em que o outro cônjuge, ou o próprio, esteja em regime de teletrabalho, na medida em que essa modalidade de prestação do trabalho não pode ser equiparada a uma situação de ausência.

 

4. AS RESTRIÇÕES AOS DIREITOS LIBERDADES E GARANTIAS E OS DIREITOS LABORAIS

A declaração do estado de emergência nos termos dos Decretos do Presidente da República nº 14-A/2020, de 18 de Março e nº 17-A/2020, de 2 de Abril implicam a limitação de um conjunto de direitos, liberdades e garantias, mas deve fazê-lo apenas na medida do necessário para que possam ser adoptadas as medidas destinadas a combater a epidemia que está na origem desta declaração.

Nos termos constitucionais, a declaração e execução do estado de emergência devem respeitar o princípio da proporcionalidade e limitar-se ao estritamente necessário, nomeadamente quanto à extensão, duração e meios utilizados, ao pronto restabelecimento da normalidade constitucional.

Isto significa que, neste caso concreto, quaisquer restrições dos direitos, liberdades e garantias devem conter-se nos justos limites do que seja essencial, adequado e necessário para salvaguardar a saúde pública e o direito à saúde e à vida de todos os cidadãos.

Neste quadro, a declaração do estado de emergência suspendeu parcialmente um conjunto de direitos, liberdades e garantias, designadamente o direito de deslocação e fixação em qualquer parte do território nacional; os direitos de propriedade e de iniciativa económica privada; o direito de reunião e de manifestação, a liberdade de culto na sua dimensão colectiva; o direito de resistência; e alguns direitos fundamentais dos trabalhadores, entre os quais o direito de greve, sendo que nenhuma das limitações permitidas a estes direitos e liberdades tem carácter geral, mas é admitida apenas na medida do necessário à salvaguarda dos direitos que se pretendem salvaguardar com estas restrições.

· A suspensão do direito de greve

Nos termos da declaração do estado de emergência, o direito de greve está suspenso “na medida em que possa comprometer o funcionamento de infraestruturas críticas ou de unidades de prestação de cuidados de saúde, bem como em sectores económicos vitais para a produção, o abastecimento e fornecimento de bens e serviços considerados essenciais à população”.

Assim, apesar de aparentemente a suspensão do direito de greve ter apenas carácter parcial, na realidade esta suspensão abrange potencialmente todos os sectores de actividade e vai muito além da própria definição de sectores que se destinam à satisfação de necessidades sociais impreteríveis, constante da lei laboral, e que já constitui em si uma limitação ao direito de greve nos termos gerais.

A CGTP-IN considera que esta suspensão do direito de greve, para mais com o carácter generalizante que assume, é desnecessária e desproporcional no caso concreto da situação de calamidade pública que esteve na origem da declaração do estado de emergência, uma vez que não está de modo nenhum demonstrado que esta restrição se apresente como essencial, adequada e necessária para a salvaguarda da saúde pública e da vida e saúde dos portugueses.

Na prática, com esta suspensão do direito de greve, os trabalhadores ficam privados do instrumento por excelência de defesa dos seus direitos, num quadro em que as violações desses direitos e os abusos por parte das entidades patronais se multiplicam um pouco por toda a parte; em que se anunciam despedimentos em massa em várias empresas e sectores de actividade; em que todos os dias os trabalhadores se sentem indefesos contra as prepotências patronais que lhes são impostas a pretexto da epidemia e dos seus efeitos.

Aliás, no quadro do próprio combate à epidemia, os direitos à segurança e saúde de muitos trabalhadores estão a ser constantemente violados pelas entidades patronais que se recusam, impunemente, a acatar as medidas decretadas pela Autoridade de Saúde e pelo Governo, nomeadamente as relativas à higienização dos espaços, distanciamento social entre trabalhadores nos locais de trabalho, fornecimento de equipamentos de protecção individual e obrigatoriedade de trabalho em casa sempre que as funções o permitam.

E, perante tudo isto, não lhes é permitido reagir colectivamente!

De facto, na presente situação, a suspensão com carácter generalizado do direito de greve é totalmente incompreensível e injustificada, e não é mais, no entender da CGTP-IN, do que um caminho aberto às entidades patronais para que não encontrem resistência efectiva e organizada à perpetração de quaisquer abusos. Ou seja, em nosso entender, não se trata de uma medida necessária e essencial à salvaguarda de outros direitos fundamentais, mas apenas de uma medida de salvaguarda dos interesses económicos das empresas.

· A suspensão do direito de participação das associações sindicais e comissões de trabalhadores na elaboração da legislação do trabalho

No quadro da prorrogação do estado de emergência foi igualmente suspenso o direito das associações sindicais e comissões de trabalhadores participarem na elaboração da legislação laboral “na medida em que o exercício de tal direito possa representar demora na entrada em vigor de medidas legislativas urgentes para os efeitos previstos neste Decreto”.

Embora possamos compreender que os períodos fixados na lei para apreciação de projectos legislativos na área laboral se mostrem demasiado longos numa situação como a que estamos a viver, que exige rapidez de resposta, consideramos que a suspensão pura e simples deste direito constitucional é excessiva para o efeito, na medida em que seria suficiente que se encurtassem os prazos previstos e se simplificasse o processo, permitindo que as organizações se pronunciassem no sentido de acautelar os direitos e interesses dos trabalhadores.

Estamos a viver uma situação de calamidade pública, inesperada a todos os títulos e com manifestações e consequências absolutamente inéditas. Ou seja, trata-se de uma situação em que facilmente se cometem abusos e se justificam ou toleram esses abusos, em nome quer da necessidade de combater a epidemia para salvaguardar a saúde pública, quer da necessidade de proteger a economia e salvar as empresas. Neste cenário, os trabalhadores e os seus direitos são relegados para segundo plano e, por isso, torna-se fundamental fortalecer os instrumentos que a Constituição e a lei lhes atribuem para defesa desses mesmos direitos.

Assim, a CGTP-IN considera que a suspensão do direito de participação das associações sindicais e comissões de trabalhadores na elaboração da legislação laboral é excessiva e não se mostra essencial à salvaguarda de outros direitos fundamentais, configurando-se como mais uma medida que retira aos trabalhadores e às suas organizações representativas os principais instrumentos de defesa dos seus direitos num momento em que são mais do que nunca necessários.

· A suspensão do direito de reunião e de manifestação

No âmbito da declaração do estado de emergência, é restringido o direito de reunião e de manifestação, na medida do necessário para reduzir o risco de contágio e executar medidas de prevenção e combate à epidemia.

Embora esta limitação decorra do facto de estar cientificamente comprovada a necessidade de manter o distanciamento social para evitar a propagação do coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, a CGTP-IN considera que, designadamente, a restrição do direito de reunião e de manifestação não pode ser entendida, nem servir de pretexto para impedir que os trabalhadores e as suas estruturas representativas, especialmente os sindicatos, se manifestem colectivamente contra violações de direitos e abusos das entidades patronais ou em defesa das suas reivindicações e, para isso, concertem posições de luta conjuntas.

· A suspensão de outros direitos fundamentais dos trabalhadores

A declaração do estado de emergência restringe também um conjunto de outros direitos fundamentais dos trabalhadores, ao prever que as autoridades podem determinar que quaisquer trabalhadores de entidades públicas ou privadas se apresentem ao serviço e desempenhem funções em local diverso, em entidade diversa e em condições e horários de trabalho diversos daqueles em que trabalham normalmente, designadamente em serviços públicos considerados essenciais.

Na prática, isto significa que todos os trabalhadores estão potencialmente sujeitos a serem requisitados para desempenhar quaisquer funções, ficando sem efeito as regras legais e convencionais que normalmente lhes são aplicadas, designadamente em matéria de mobilidade geográfica e mobilidade funcional e de tempo de trabalho.

Isto não significa que os direitos laborais estejam suspensos ou possam ser restringidos a bel-prazer das entidades patronais; as restrições autorizadas pela declaração do estado de emergência têm que ser devidamente decretadas pelas autoridades competentes, com a devida fundamentação, duração e extensão.

· Os direitos laborais em geral não estão suspensos

A legislação laboral e os instrumentos de regulamentação colectiva aplicáveis continuam a vigorar plenamente na ordem jurídica e devem ser normal e integralmente cumpridos.

As violações do direito a férias, obrigando os trabalhadores a gozar férias compulsivamente, os despedimentos arbitrários, a suspensão de pagamento de salários em qualquer das sua componentes, incluindo o subsidio de alimentação, a violação dos direitos de saúde e segurança no trabalho, a imposição de tempos de trabalho e horários de trabalho em violação das regras legais e convencionais em vigor não são aceitáveis, e não podem ser tolerados a pretexto do surto pandémico e das dificuldades económicas das empresas, no quadro da declaração do estado de emergência e do combate à epidemia.

A propagação do novo coronavírus e da doença COVID-19 não podem servir de desculpa para tudo.

Embora possa parecer o contrário, a democracia não está suspensa e a Constituição e a lei continuam a vigorar plenamente. A declaração do estado de emergência não significa a suspensão da Constituição e dos limites constitucionais, mas sim um modo de regular, em conformidade com a própria Constituição, a necessidade de ultrapassar alguns desses limites, para salvaguarda de direitos fundamentais que a situação de calamidade pública (neste caso a epidemia) está a pôr em causa.

Assim, nestes tempos difíceis, o Governo tem a obrigação de cumprir e a fazer cumprir os direitos dos trabalhadores, nomeadamente mantendo e reforçando a fiscalização das condições de trabalho e sancionando devidamente todas as violações de direitos dos trabalhadores.

· As limitações aos despedimentos

A declaração do estado de emergência autoriza, entre outras restrições ao direito de propriedade e ao direito de iniciativa económica privada, limitações aos despedimentos.

No uso desta permissão, o Governo optou por uma disposição tímida, traduzida no reforço dos poderes da Autoridade para as Condições de Trabalho para fiscalizar a licitude dos despedimentos e suspender os efeitos do despedimento em que se verifiquem indícios de ilicitude, mantendo o contrato de trabalho em vigor, mediante notificação ao empregador para regularizar a situação, e até que a situação do trabalhador seja regularizada ou até ao transito em julgado de decisão judicial.

De notar que estes poderes acrescidos não são exercidos relativamente a todas as modalidades de cessação de contratos de trabalho, mas apenas a situações específicas, nomeadamente, despedimento por facto imputável ao trabalhador (ou despedimento com justa causa), despedimento colectivo e despedimento por extinção do posto de trabalho ou quando haja violação do princípio da proibição dos despedimentos sem justa causa, falta de processo prévio ou despedimento de grávida, puérpera ou lactante ou de trabalhador no exercício de responsabilidades parentais, sem parecer prévio da CITE

Também não há reforço de atribuições no que respeita à contratação a termo, falsas prestações de serviços, contratos de trabalho temporário e outras situações de vinculação precária

A CGTP-IN constata, assim, que a possibilidade de introduzir limitações aos despedimentos não foi plenamente aproveitada para proteger os trabalhadores e salvaguardar os seus postos de trabalho, contra os abusos que estão a ser cometidos por muitas empresas, inclusivamente aquelas que estão a solicitar e a receber apoios do Estado.

A realidade é que, no âmbito do estado de emergência, se introduziram muitas, algumas excessivas e injustificadas restrições, aos direitos dos trabalhadores, mas quando se trata das empresas as limitações são muito mais cautelosas e menos significativas.

5. MEDIDAS DIRIGIDAS AOS DESEMPREGADOS, AOS MAIS FRAGILIZADOS E OUTROS APOIOS

Não restam muitas dúvidas que, face à inédita crise de saúde pública que estamos a viver e em consequência dela, vamos ser confrontados com uma grave situação económico-social, cujos primeiros sinais já se fazem sentir com o encerramento compulsivo de muitas empresas e estabelecimentos e todo um cortejo de despedimentos, dispensa indiscriminada de trabalhadores com vínculos precários e violações sucessivas de direitos dos trabalhadores.

Neste cenário e tendo em conta as previsões que circulam, o Governo tem anunciado várias medidas visando alegadamente apoiar as famílias, as empresas e o emprego.

No entanto, conforme já constatámos mais acima, as medidas mais significativas dirigem-se exclusivamente às empresas; as supostas medidas de apoio à manutenção de postos de trabalho estão cheias de lacunas que permitem o despedimento indiscriminado sobretudo dos trabalhadores com vínculos precários; as medidas para as famílias centram-se demasiado na facilitação do crédito, o que equivale ao seu endividamento e, logo, a dificuldades financeiras acrescidas no futuro, nomeadamente se a crise se prolongar e o desemprego atingir níveis muito elevados.

Por enquanto, no que toca a medidas de protecção social, com excepção de um alargamento do subsidio de doença nas situações de isolamento profiláctico ou de doença COVID-19 e de algum apoio temporário às famílias que não possam trabalhar devido ao encerramento das escolas e outros equipamentos de apoio à infância ou à deficiência, o Governo limitou-se a prever a prorrogação extraordinária das prestações de desemprego e de todas as prestações pagas pelo sistema de Segurança Social que garantam mínimos de subsistência e a suspender as reavaliações das condições de manutenção das prestações.

No que respeita à prorrogação, a previsão é bastante dúbia, nomeadamente quanto às prestações a que se aplica – para além das prestações de desemprego expressamente referidas (subsidio de desemprego e subsidio social de desemprego) e, indubitavelmente, o Rendimento Social de Inserção (RSI), temos alguma dificuldade em determinar com exactidão que outras prestações “asseguram mínimos de subsistência” e são por isso consideradas para este efeito. Na realidade, não se compreende porque motivo não são expressamente identificadas as prestações que são prorrogadas.

A CGTP-IN considera que estas medidas são claramente insuficientes para garantir a protecção social dos trabalhadores no período difícil que estamos a viver e ainda mais durante a crise económica que se avizinha.

Por um lado, estas parcas medidas são dirigidas no imediato a quem neste momento já está a receber estas prestações, o que, sendo obviamente importante, não é suficiente para acautelar situações de desprotecção já directamente resultantes da actual crise.

Não podemos ignorar que a situação já está a gerar desemprego e, como sabemos até pela experiência ainda recente, o desemprego gera fenómenos de pobreza, novas situações de pobreza e agravamento das situações de pobreza já existentes.

Neste quadro, é essencial que o sistema público de Segurança Social e, em primeiro lugar, o sistema contributivo que se destina à substituição dos rendimentos de trabalho perdidos nomeadamente em razão de doença e desemprego, esteja preparado para dar resposta imediata às necessidades dos trabalhadores atingidos pela crise epidémica e pela crise económica.

Neste sentido, a CGTP-IN entende que é premente reforçar a protecção social:

· Nas situações de doença, não apenas através de medidas excepcionais que se esgotem com a situação de emergência actual, mas de alterações que incorporem definitivamente no respectivo regime soluções mais adequadas e de maior alcance que as actualmente vigentes, designadamente no que toca ao valor das prestações, que deve deixar de variar em função da duração do período de incapacidade para o trabalho e passar a corresponder a um valor fixo suficiente para satisfazer dignamente as necessidades do trabalhador doente e da sua família;

· Nas situações de desemprego, sendo essencial alargar as condições de acesso, nomeadamente para permitir que os trabalhadores com vínculos precários de menor duração possam aceder a protecção; aumentar o valor da prestação, nomeadamente através da indexação dos limites ao salário mínimo nacional; alargar os períodos de atribuição do subsídio de desemprego, em particular para os trabalhadores mais velhos; facilitar o acesso ao subsídio social de desemprego, alterando as regras da condição de recurso.

Esse reforço deve abranger quer o Sistema Previdencial quer a vertente de solidariedade (não contributiva) do sistema público de Segurança Social, financiada por impostos, de forma a que esteja em condições de assegurar rendimentos de subsistência aos que se encontrem em situações de pobreza ou exclusão social.

Nesta componente, a CGTP-IN entende que tem que ser reforçado o apoio às famílias, em particular na perspectiva de um encerramento mais prolongado dos estabelecimentos de ensino e de toda a rede de equipamentos de apoio à infância, caso em que os progenitores terão que permanecer ausentes do trabalho para prestar assistência aos menores a seu cargo e não poderão ficar privados dos rendimentos essenciais à sua subsistência e da respectiva família.

Em segundo lugar, terão também que ser reforçadas, e facilitado o acesso, a todas as prestações que garantam mínimos de subsistência, a fim de proteger condignamente todos os que se encontrem em situação de pobreza e/ou exclusão social.

Por fim, no quadro que se avizinha e tendo como objectivo a prestação do melhor apoio aos desempregados, é necessário que o serviço público de emprego melhore o ajustamento entre a oferta e a procura de emprego, visando a resposta às necessidades dos desempregados que certamente irão acorrer ao mesmo nos próximos tempos. Perante os despedimentos de que demos conta anteriormente e os atropelos aos direitos, consideramos ser necessário que o IEFP redobre a sua atenção na validação das ofertas e na concessão de apoios ao emprego nas suas várias formas.

Desde logo verificando as condições de admissibilidade de contrato a termo e também se o salário da oferta cumpre o requisito de ter uma retribuição igual ou superior à remuneração mínima mensal garantida por lei ou à retribuição fixada em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho aplicável ou se respeita os salários praticados na entidade empregadora, garantindo o princípio de que a trabalho igual ou de valor igual deve corresponder um salário de igual valor. Esta verificação deve também ser feita no momento da colocação.

Outra medida fundamental no apoio social neste difícil período, consiste na alteração da fórmula de cálculo dos apoios a conceder, mais concretamente, no que diz respeito aos que visam a substituição de rendimentos ou a compensação pela sua perda. Assim, defendemos que a base de cálculo para as prestações deste tipo tenha como referência um montante equivalente à RMMG, ao invés de se utilizar o IAS, com valor inferior e que consistiu na criação de uma referência ficcional com o propósito de proceder à redução, por via indirecta, dos montantes a atribuir. Ao invés, o RMMG constitui uma referência concreta e real, assente nos rendimentos efectivamente auferidos por muitos trabalhadores e mais apto a produzir o efeito pretendido de manutenção, dentro do possível, do rendimento dos trabalhadores e das famílias.

A CGTP-IN defende ainda a revogação de medidas de apoio ao emprego que prevejam a isenção parcial ou total de contribuições sociais para contribuir para conter a descapitalização da Segurança Social.

Sem deixar de reconhecer que o Governo tomou algumas medidas dirigidas à protecção das famílias, por exemplo no que respeita à habitação, nomeadamente moratórias no pagamento das prestação de crédito à habitação, suspensão da caducidade dos contratos de arrendamento no período de emergência, não aumentos de renda, suspensão de despejos, entre outras, a CGTP-IN considera que são muito insuficientes, por um lado perante as consequências económicas da epidemia cuja gravidade é já previsível e, por outro, face à enormidade dos apoios que estão a ser concedidos às empresas sem quaisquer garantias para os trabalhadores, como já estamos a constatar diariamente.

Acresce que preconizar medidas que apontam para o endividamento das famílias, empurrando-as para a contracção de empréstimos a fim de satisfazer no imediato algumas das suas obrigações (por exemplo as rendas e outras prestações), não é solução, sobretudo quando se perspectiva uma recessão económica tanto mais profunda e prolongada quanto não for travada a destruição de emprego e o corte nos rendimentos do trabalho.

A CGTP-IN considera que, neste momento especialmente grave da vida do país, é fundamental que se comece desde já a preparar o futuro, o que passa em primeiro lugar pela garantia das retribuições e do emprego e pela valorização do trabalho com direitos, mas também por uma Segurança Social robusta e capaz de assegurar a todos a protecção de que necessitam em todos os casos de redução ou perda de rendimentos do trabalho, por forma a garantir que não regressamos abruptamente aos inaceitáveis níveis de pobreza e privação material que conhecemos nos anos negros de 2013 e 2014.

 

REIVINDICAÇÕES DA CGTP-IN

ASSEGURAR O EMPREGO E OS SALÁRIOS

– REFORÇAR O PAPEL DO ESTADO – DESENVOLVER O PAÍS

As reivindicações da CGTP-IN visam garantir que, quer o emprego, quer os rendimentos do trabalho, não são postos em causa tendo como justificação a presente situação. Defender o emprego e assegurar as retribuições é uma exigência face ao momento actual por que passam os trabalhadores e as suas famílias e a melhor garantia que o país sai de forma mais célere da fase recessiva.

São propostas que entendemos urgentes e que devem ser implementadas de imediato, que vão exigir uma reafectação de recursos de magnitude ainda imprevisível, que está dependente da duração do combate ao surto epidémico que continua a ser a prioridade para a salvaguarda da vida e da saúde de todos.

No entanto, tendo em conta o nível de desigualdades na repartição da riqueza entre o trabalho e o capital e as avultadas verbas que por opção do Governo são transferidas para o grande capital, consideramos que há recursos e condições para que desta vez a resposta à situação recessiva da economia seja geradora de maior justiça social e indutora de mais desenvolvimento.

A situação actual exige também o reforço dos serviços públicos, da protecção social e dos instrumentos para a intervenção do Estado em diferentes áreas da economia nacional.

Rejeitamos que a Segurança Social seja descapitalizada e defendemos que deve ser, nesta fase, o Orçamento do Estado a assegurar os rendimentos do trabalho quando as empresas, comprovadamente não consigam.

A seu tempo, pelos motivos já indicados, apresentaremos as nossas propostas para fortalecer as contas públicas.

 

I - ASSEGURAR O EMPREGO E OS RENDIMENTOS

Para assegurar o emprego e os rendimentos, fazem falta as seguintes medidas:

1. Proibição de despedimentos e a revogação da possibilidade de usar o período experimental para este efeito enquanto durar a epidemia;

2. Suspensão da caducidade de todos contratos de trabalho a termo resolutivo, contratos de trabalho temporário e de prestação de serviços, bem como a extensão dos prazos dos contratos ou bolsas dos trabalhadores científicos;

3. A garantia de cumprimento de todos os direitos dos trabalhadores, nomeadamente quanto ao pagamento da totalidade da retribuição em todas as suas componentes;

4. Pagamento integral das retribuições aos trabalhadores em regime de lay-off e consulta obrigatória às estruturas representativas dos trabalhadores;

5. A protecção sanitária dos trabalhadores que estão no activo e o respeito pelos tempos de trabalho e as restantes regras de SST;

6. A contratação sem termo dos trabalhadores que estão a reforçar as funções sociais do Estado e os Serviços Públicos e conversão para esta modalidade de todos os contratos que já tenham sido celebrados contemplando modalidades temporárias;

7. A consideração como nulos e de nenhum efeito, de todos os despedimentos e cortes nas retribuições realizados desde, e tendo como justificação/motivo, a situação resultante da epidemia do COVID19;

8. Uma fiscalização apertada do cumprimento da legislação de trabalho, seja através das medidas tomadas no âmbito da epidemia, seja na restante legislação em vigor, com reforço de meios da ACT para intervir nos processos, devendo ser ouvidas as associações sindicais respectivas.

9. Igualdade de acesso às medidas de salvaguarda dos rendimentos aos trabalhadores a recibos verdes, inclusive os que estão isentos de pagamento à segurança social por se encontrarem no primeiro ano de actividade.

II – APOIAR OS TRABALHADORES E AS FAMÍLIAS: DFENDER A SEGURANÇA SOCIAL

O momento actual exige que a Segurança Social seja colocada a cumprir os objectivos para os quais foi criada. Os trabalhadores e as famílias precisam ainda mais da protecção social, cuja inexistência remeteria mais de 40% dos portugueses para uma situação de pobreza. Incrementar os apoios e libertar a Segurança Social da instrumentalização que desvia verbas para as grandes empresas, é um objectivo da CGTP-IN. Para tal é necessário:

1. Alargamento do “apoio excepcional à família para trabalhadores por conta de outrem” aos ascendentes que são objecto de medidas de isolamento profiláctico, que fazem parte de grupos de risco, ou que estão em situação de dependência;

2. Alargar a atribuição do apoio excepcional à família, aos casos em que o outro cônjuge, ou o próprio, esteja em regime de teletrabalho, na medida em que essa modalidade de prestação do trabalho não pode ser equiparada a uma situação de ausência;

3. Garantir que, em regime de teletrabalho, as entidades patronais pagam aos trabalhadores o mesmo salário e demais componentes retributivas que em regime presencial, que asseguram a instalação e manutenção dos equipamentos de trabalho e despesas inerentes, e que respeitam a privacidade do trabalhador e da sua família e os horários de trabalho;

4. Alterar as medidas de apoio ao emprego que prevejam a isenção parcial ou total de contribuições sociais, substituindo-as por apoios, financiados directamente pelo Orçamento do Estado;

5. Prever que o subsídio de doença corresponde a 100% da remuneração de referência, não só durante o período de isolamento profiláctico, mas durante todo o período de doença COVID-19.

6. Assegurar que o valor do subsídio para assistência a filho ou a neto durante os períodos de impedimento para o trabalho resultantes da necessidade de acompanhar filhos ou outros dependentes a cargo em isolamento profiláctico, incluindo aqui filhos ou outros dependentes a cargo pelo menos até aos 15 anos de idade, corresponde a 100% da remuneração de referência para todos os trabalhadores, do sector privado e do sector público;

7. Garantir que o apoio extraordinário às famílias abrange todo o tempo de encerramento das escolas, creches, jardins-de-infância, ATL e outras instituições de apoio à infância e à deficiência, incluindo o período das férias da Pascoa;

8. Alargar as condições de acesso ao subsídio de desemprego, nomeadamente para permitir que todos os trabalhadores que fiquem desempregados, incluindo os com vínculos precários de menor duração possam aceder a protecção; reduzir o período de garantia; aumentar o valor da prestação, nomeadamente através da indexação dos limites ao salário mínimo nacional; alargar os períodos de atribuição do subsídio de desemprego, em particular para os trabalhadores mais velhos; facilitar o acesso ao subsidio social de desemprego, alterando as regras da condição de recursos.

9. Criar um apoio extraordinário, financiado pelo Orçamento do Estado, para os desempregados que se encontrem em situação de pobreza e não aufiram quaisquer prestações sociais de apoio no desemprego;

III – REFORÇAR O ESTADO. REDIRECCIONAR OS APOIOS ÀS EMPRESAS. REFORÇAR A PRODUÇÃO NACIONAL NO IMEDIATO

A importância do papel do Estado é hoje uma evidência. A CGTP-IN defende uma acção alargada, não só ao nível dos serviços públicos e das funções sociais do Estado, mas também para a garantia de bens e serviços essenciais que a opção pelas privatizações deixou nas mãos dos privados e que, em caso algum, pode faltar às populações no actual momento.

É necessário também uma aposta no sector produtivo para diminuir a dependência face ao exterior, desde logo nos sectores mais deficitários neste momento. Estas são mudanças urgentes que terão que permanecer e ser reforçadas após o fim da epidemia.

Assim, num quadro de recursos limitados e necessidades crescentes, é essencial redireccionar os apoios concedidos às empresas. É obsceno que aqueles que distribuem milhões de euros em dividendos, se apropriem de verbas que são negadas aos trabalhadores, ao povo e aos micro, pequenos e médios empresários.

A - Reforçar os serviços públicos e as funções sociais do Estado. Alargar a intervenção do Estado:

1. Aumentar de forma significativa o investimento nos serviços públicos com especial urgência para o aumento da capacidade de resposta do SNS, incluindo a contratação de mais trabalhadores, a sua valorização e o investimento em equipamentos e materiais;

2. Impedir o agravamento dos preços e a especulação relativamente a bens e serviços essenciais, nomeadamente através da fixação dos preços;

3. A defesa do direito à habitação:

· No caso da moratória para crédito a habitação própria permanente, ao invés da lei definir, à partida, as categorias de trabalhadores que são abrangidos, deve encontrar-se um critério parecido ao da suspensão do pagamento da renda, que abrange qualquer caso em que haja uma quebra de 20% do rendimento ou em que se ultrapasse a taxa de esforço de 35%;

· No caso da protecção do arrendatário em mora no pagamento da renda, devemos defender que, no cálculo da taxa de esforço de 35%, o valor remanescente para o agregado familiar não seja o IAS, mas antes o RMMG;

· O alargamento do prazo previsto para a devolução dos montantes em atraso, para um período não inferior a 36 meses;

4. Proibição, durante a epidemia, do corte de água, luz e gás e telecomunicações por falta de pagamento.

5. Aposta na produção nacional, desde logo na área da saúde e no sector alimentar, com destaque para a agricultura e pescas para garantir a soberania alimentar e diminuir a dependência face ao exterior;

6. A suspensão de transferências de recursos públicos para apoio à banca privada, PPP e benefícios fiscais.

B – Redireccionar os apoios às empresas

O direccionamento dos apoios para as micro, pequenas e médias empresas e a introdução de regras restritivas para as grandes empresas acederem a apoios, reservando esta possibilidade apenas quando comprovadamente os apoios se revelarem determinantes e o último recurso para a manutenção da actividade, devendo as empresas apoiadas ressarcir o Estado das ajudas concedidas antes de distribuírem quaisquer dividendos ou outro tipo de remuneração do capital.