22 de MARÇO - DIA MUNDIAL DA ÁGUA
Cuidar da água, defender a sua gestão pública e democrática, combater a privatização!
Assinala-se hoje, 22, sob o lema “Águas subterrâneas: Tornando o invisível visível”, o Dia Mundial da Água. A água subterrânea é invisível, mas o seu impacto é visível em todos os lugares. É um tesouro escondido que temos de preservar e cuidar. Isso só é possível promovendo uma gestão da água como direito e não como negócio!
Visíveis são ainda as consequências provocadas pandemia de Covid-19, que aprofundou brutalmente as desigualdades e que, passados dois anos, não só estão longe de estar superadas, como são agravadas pela invasão da Ucrânia pela Rússia, uma guerra que, como todas as outras, urge parar imediatamente, pondo fim ao sofrimento que atinge em primeiro lugar as populações mais desfavorecidas.
Recorde-se que três em cada dez pessoas não têm acesso a água potável e mais de 2 mil milhões vivem em países com um elevado nível de “stress” hídrico, enquanto cerca de 4 mil milhões de pessoas passam por uma grave escassez de água potável durante, pelo menos, um mês. A par desta realidade, também a pobreza e o desemprego atingem, segundo a ONU e a OIT, cerca de 1.000 milhões de pessoas em todo o mundo.
Por estes dias, tem lugar, no Senegal, o Fórum Mundial da Água, evento controlado pelas multinacionais que procuram, com a conivência dos poderes políticos, apropriar-se dos territórios, das nascentes, dos rios e reservatórios e dos serviços públicos de água e saneamento, submetendo-os à lógica do mercado e do lucro.
Em contraponto, movimentos sociais, sindicatos, organizações diversas, população, a quem expressamos a nossa solidariedade, promovem o Fórum Alternativo Mundial, afirmando uma vez mais a água como bem comum, a gestão pública, comunitária e democrática e a luta contra a mercantilização e a privatização.
O contexto deste Dia Mundial da Água é também o do crescente e cada vez mais sentido impacto das alterações climáticas. A seca gravíssima que o nosso país enfrenta, com consequências dramáticas, a segunda num espaço de cinco anos, é disso exemplo, e exige medidas urgentes que há muito deviam ter sido tomadas.
Porém, o que se verifica é o aproveitamento da escassez para justificar a mercantilização da água e a subida dos preços – como ameaçaram o Ministro do Ambiente e a Presidente da ERSAR - organismo que em boa hora perdeu o poder de impor os preços da água, saneamento e resíduos às entidades municipais e intermunicipais – ao afirmar que têm de ser os consumidores a pagar nas facturas da água as obras de manutenção e qualificação da rede de abastecimento – procurando passar o ónus do problema para os municípios e para as famílias, num país onde são milhares as pessoas que não conseguem satisfazer as necessidades básicas, como é o consumo de energia, cujos custos têm vindo a aumentar e ameaçam os preços da água. E é também a primazia do lucro que explica o porquê de, estando o país numa situação de seca, os detentores das barragens electroprodutoras continuassem a esvaziar as barragens aproveitando a alta dos preços da energia.
O que se regista é a desresponsabilização do Estado na administração, planeamento e gestão da água, como aconteceu com a destruição do Instituto da Água e suas delegações regionais, com impactos muito negativos na prestação de serviços públicos e na protecção dos recursos hídricos (lembremos que cerca de 31% da água destinada ao consumo humano tem origem subterrânea).
MERCANTILIZAÇÃO NÃO É SOLUÇÃO
Sendo cada mais evidente que a água, enquanto recurso escasso, deve ser gerida e utilizada ao serviço da comunidade em geral e não ser um factor de incremento da produção para favorecer processos de acumulação e concentração de capital, é particularmente negativo que o Governo insista em forçar a agregação dos serviços municipais de água «em baixa» abrindo dessa forma caminho a uma gestão mercantil da água, provocando o aumento dos preços, reduzindo o controlo democrático municipal e fragilizando os direitos laborais.
A este propósito, a par de Penacova, que insiste em sair da APIN, são mais três as autarquias que pretendem sair das “agregações”, caso de Freixo-Espada à Cinta, que integra a ADIN – Águas do Interior Norte, e que contesta os valores exorbitantes nas facturas de água que chegaram a atingir 200%, e os municípios de Valença e Vila Nova de Cerveira, que estudam a saída da Águas do Alto Minho, onde os preços também subiram de forma significativa.
Confirmando a progressiva remunicipalização dos serviços de água e saneamento, saudamos vivamente o município de Setúbal pela decisão de terminar a concessão com a Aquapor/Ags, efectuada pelo PS em 1997, e o município de Fafe que, após o fim do contrato celebrado em 1996 com a Indáqua, recuperou a gestão em Setembro passado. Apoiamos a autarquia de Paredes que prossegue o resgate da concessão da água e saneamento, apesar das pressões e da chantagem da concessionária privada, a Be Water, e da recusa do visto pelo Tribunal de Contas dos empréstimos necessários solicitados pelo município.
Ao contrário, o município de Santo Tirso recuou na intenção de resgatar a concessão, prorrogando o contrato com a Indáqua por mais 15 anos, o que permitirá, segundo o município, uma redução do tarifário entre 20% e 58%, o que é a demonstração clara dos preços abusivos que eram praticados. Porém, baixar o preço da água desta forma significativa e ainda tentar lucrar, obriga as empresas privadas a cortar na manutenção, nos investimentos e nas condições de trabalho. Isso pode resultar num serviço público de “baixo custo”, que se mostrará insustentável a longo prazo. As entidades públicas não podem e não devem envolver-se numa estratégia de «dumping» para manter os preços baixos a todo o custo. Embora o preço seja importante e muitas vezes decisivo, não é o único critério. O controlo democrático e a sustentabilidade do serviço são igualmente importantes.
As consequências da privatização dos serviços municipais continuam a ser ruinosas para as autarquias e para as populações abrangidas, como na Covilhã, em Barcelos, ou em Paços de Ferreira, para dar alguns exemplos, sendo que neste último caso os comerciantes têm de abrir as torneiras e desperdiçar centenas de litros de água para pagar menos na factura ao final do mês, pois se não atingirem o consumo mínimo mensal de 1000 litros (1m3), pagam a tarifa máxima.
É por tudo isto que prosseguiremos o combate pela gestão pública, mobilizando as populações e trabalhadores, conscientes de que os interesses privados não só promovem a privatização, travada pela luta, como procuram impedir a recuperação dos serviços públicos.
Saudamos todos os trabalhadores do sector, pelo esforço, empenho e dedicação que colocam diariamente nas suas tarefas, reafirmando o combate pela melhoria das condições de trabalho, por salários dignos e pela aplicação generalizada do suplemento de penosidade e insalubridade, bem como pela sua melhoria, em consonância com as reivindicações do STAL e dos trabalhadores, condições essenciais para atrair e fixar mão-de-obra qualificadas nestes serviços essenciais.
Finalmente, e como temos afirmado, as crises que atingem a humanidade não se resolvem insistindo num modelo de crescimento predador, destrutivo e na privatização dos bens públicos, como a água. Pelo contrário! O que precisamos é de organizar e orientar os processos produtivos para o interesse comum, para o respeito pela natureza; de recuperar e valorizar a função ecológica e social da água, impedindo a sua utilização como factor de acumulação e concentração de capital.
O que é preciso é assegurar uma gestão pública robusta, competente, agir na preservação e protecção de todos os valores da água, assegurar o direito à água e saneamento para todos, valorizar o serviço público, reforçar o investimento para cuidar do futuro.
Fonte: STAL