A CGTP-IN considera inaceitável que haja declarações de membros do Governo que objectivamente incentivam o modelo de baixos salários e de longos horários de trabalho, que a Comissão Europeia entenda que o direito de contratação colectiva constitui um obstáculo ao investimento e que uma instituição com a responsabilidade da Agência de Gestão de Tesouraria da Divida Pública (IGCP) promova a venda de dívida pública junto dos investidores, particularmente dos investidores externos, referindo como positiva nomeadamente a alta flexibilidade salarial, a fraca legislação de protecção de emprego, a reduzida cobertura das prestações de desemprego e o programa de privatizações.
Estas mensagens e acções são contraditórias com as promessas de um novo modelo de crescimento e de desenvolvimento do país, em que são peças essenciais a ruptura com as políticas de exploração e empobrecimento, desenvolvidas pelo anterior Governo do PSD-CDS, a valorização do trabalho e a dignificação dos trabalhadores, uma mais justa distribuição da riqueza e uma sociedade mais coesa e com menos desigualdades. Comprometem o nosso futuro económico e social porque dão continuidade a políticas que tornaram o país mais pobre e vulnerável.
Portugal continua a ser um país com baixo nível de salários, com maior número de horas anuais de trabalho no conjunto dos países da OCDE e com um reduzido salário mínimo nacional, o qual se situa atrás nomeadamente da Grécia e de Espanha. É também um país onde a contratação colectiva teve uma queda abrupta em termos de convenções que anualmente são renovadas, em consequência quer do Código de Trabalho de 2003, das alterações de 2009 e dos impactos negativos resultantes das medidas tomadas no período da troika.
A política de "austeridade" teve consequências brutais sobre o trabalho, salientando-se:
§ O agravamento da injustiça na distribuição entre os rendimentos do trabalho e os rendimentos de empresa e de propriedade. Os ordenados e salários passaram de 37,4% do valor do PIB em 2009 para apenas 33,7% em 2015, sendo este o valor mais baixo dos últimos 20 anos;
§ A baixa cobertura dos trabalhadores abrangidos pela renovação da contratação colectiva, verificando-se uma situação de bloqueamento numa parte significativa dos processos de revisão;
§ A desregulamentação dos horários de trabalho, verificando-se que os horários de trabalho são cada vez mais determinados pelas necessidades das empresas, não tendo também em conta as necessidades dos trabalhadores, a saúde e a conciliação entre o trabalho e a vida pessoal e familiar;
§ O retorno da emigração forçada em massa e abrangendo trabalhadores qualificados e jovens com elevadas habilitações: entre 2011 e 2015, a emigração total (permanente e temporária) abrangeu 586 mil pessoas.
Como era previsível, não ficámos com isso mais produtivos nem a competitividade da economia melhorou. Os trabalhadores e a população ficaram mais pobres e o país mais dependente, devido a uma política ruinosa que urge inverter.
Neste quadro, a CGTP-IN considera preocupantes as indicações, vindas do Ministério das Finanças, no sentido de valorizar os baixos salários e os longos horários junto de associações patronais e empresas estrangeiras e de continuar com uma política de cortes salariais dos trabalhadores da Administração Pública em regime de requalificação, agora denominado de revalorização. O que hoje se constata é a falta de trabalhadores em muitos dos serviços da Administração Pública, pelo que a sua colocação sem perda de salários e de direitos deve ser a prioridade.
Por outro lado, a CGTP-IN não aceita que uma instituição com a responsabilidade do IGCP (Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública) promova a venda de dívida pública junto dos investidores, particularmente dos investidores externos, através da "atractividade" de ter trabalhadores com baixos salários e reduzida protecção social. É o que faz numa apresentação, de 3 de Junho, destinada aos investidores, em que se invocam as "reformas estruturais" efectuadas nos últimos anos, referindo a mais alta flexibilidade salarial, a diminuição dos custos com os despedimentos, a redução da protecção social no desemprego, a diminuição de portarias de extensão de contratos colectivos publicadas, a redução do desemprego e programas de privatizações, nomeadamente.
Não é apenas chocante que, para a direcção da IGCP, seja bom não haver contratação colectiva, que os trabalhadores tenham menos indemnizações quando perdem o emprego, ou que mais de metade dos desempregados não receba prestações de desemprego. É igualmente chocante a concepção subjacente de que ter trabalhadores com menos direitos e desempregados sem protecção social é bom para vender títulos da dívida pública.
É também numa linha semelhante que a Comissão Europeia considera, num relatório de Fevereiro deste ano, no contexto do Semestre Europeu, que a contratação colectiva, em Portugal, constitui uma obstáculo, uma "barreira estrutural" ao investimento.
Para a CGTP-IN, é preciso dizer basta a este modelo e a esta política anti-laboral e anti-social. O Governo tem de associar as palavras aos actos e tomar medidas para acabar com as situações referidas e outras associadas a um modelo de exploração que precisa de ser erradicado quanto antes.
O futuro não se constrói com uma política de baixos salários e de longos horários. Um país não compensa a sua menor produtividade por ter uma estrutura produtiva débil, assente em sectores com menor incorporação de valor acrescentado, menor inovação e menor conteúdo tecnológico, com menores salários e com mais horas de trabalho. Pelo contrário, esta é uma política de baixa produtividade, que tão ruinosa tem sido para o país, e com a qual importa definitivamente romper.
Por isso urge assumir a concretização da mudança de política, investindo na produção nacional, no emprego estável e seguro, no aumento geral dos salários, no respeito pelos horários de trabalho, na aplicação das 35 horas semanais a todos os trabalhadores dos sector público e privado e no desbloqueamento da contratação colectiva. Este é o caminho certo e seguro para pôr a economia a crescer e responder às necessidades e anseios dos trabalhadores, do povo e do país, numa linha de progresso e justiça social.
Lisboa, 20.6.15