Posição sobre o Orçamento do Estado para 2020

Num quadro em que o Governo anuncia um excedente orçamental para o ano 2020, esta Proposta de Orçamento do Estado está longe de corresponder às legitimas expectativas dos trabalhadores e da população.

A Proposta de Orçamento contempla actualizações ridículas e insultuosas para os trabalhadores da Administração Pública que, claramente, fazem tábua rasa dos 10 anos em que não tiveram qualquer aumento salarial; no que respeita às pensões, que vão ser automaticamente actualizadas em valores muito baixos que não permitem sequer repor o poder de compra dos pensionistas, não existem outras medidas concretas, à excepção de uma vaga promessa de reforçar as pensões contributivas de valor mais baixo e de alterar o regime do CSI, alargando o acesso a esta prestação; na protecção dos desempregados não se avança nada de novo, havendo apenas renovação de medidas em vigor nos anos anteriores; na área fiscal, regista-se pouco alívio fiscal para as famílias, já que nada se avança no sentido da maior progressividade do IRS e se aumenta a pressão ao nível dos impostos indirectos, cujo efeito se faz sentir com maior intensidade sobre quem tem menores rendimentos.

De acordo com o Governo, o Orçamento para 2020 está estruturado em torno de 4 grandes eixos, designadamente: contas públicas certas e equilibradas; reforço do Serviço Nacional de Saúde; reforço da protecção social na perspectiva de redução das desigualdades e de combate à pobreza; e resposta ao desafio demográfico, na dupla vertente de promoção da natalidade e inserção dos jovens num mercado de trabalho mais competitivo e mais qualificado.

Porém, o facto é que a Proposta se centra muito mais na preocupação do equilíbrio das contas e da divida do que em qualquer outro aspecto.

Aliás, a maior ênfase é colocado no facto de se obter um excedente orçamental, classificado como histórico e aclamado como acontecimento extraordinário. Na verdade, porém, este facto não vai ter grande impacto na vida dos portugueses nem no desenvolvimento do país. O excedente representa 436 milhões de euros, que não vão ser aplicados em investimentos económicos e sociais, de que o país tanto precisa.

Salienta-se que, apesar das promessas, a Proposta não apresenta um reforço significativo do investimento público. Tudo o que contempla são medidas cautelosas, nunca de grande dimensão, que no final permitam garantir o tal excedente histórico.

O prometido reforço na saúde fica assim muito aquém das necessidades de um SNS depauperado a todos os níveis e que, para além do pagamento das volumosas dividas em atraso, precisa de um investimento maciço em equipamentos, materiais e recursos humanos, para além de novas respostas para uma população envelhecida e de grande aposta em inovação face aos avanços da ciência e da técnica que estão a gerar novos processos de cura e medicamentos cada vez mais dispendiosos.

Da mesma forma, o anunciado reforço da protecção social para combater as desigualdades e a pobreza fica-se mais pelas promessas do que pela realização prática – um aumento muito insuficiente das pensões de velhice, vagas promessas de novo aumento extraordinário das pensões mais baixas e aposta maior no Complemento Solidário para Idosos, prestação de solidariedade, em substituição de medidas dirigidas à alteração das regras de atualização anual das pensões de modo que os pensionistas não registem perdas sucessivas do seu poder de compra, bem como à valorização das pensões a atribuir futuramente nomeadamente através da eliminação definitiva do factor de sustentabilidade No que respeita aos desempregados tudo se mantém na mesma, com a renovação de medidas já incluídas em orçamentos anteriores, e que não têm contribuído significativamente para a redução da pobreza e da privação entre esta população.

Relativamente ao objectivo de inverter a tendência demográfica, a Proposta é ainda mais curta. O anunciado aumento da dedução fixa por dependente a partir do terceiro filho vai na realidade abranger um número muito limitado de famílias, já que para beneficiar dela é necessário ter dois filhos ambos com menos de 3 anos de idade e a dedução só se aplica ao segundo; o aumento do abono de família proposto também se mostra muito insuficiente para as necessidades das famílias, traduzindo-se em mais um tímido avanço, que abrange apenas as crianças mais novas (agora até aos 6 anos), como se a partir daí os filhos deixassem de necessitar de apoios materiais por parte dos pais. Já a conciliação da vida profissional com a vida familiar, tão importante para a promoção da natalidade, não merece referências significativas. Como o não merece a garantia da estabilidade do emprego, a subida dos salários e a regulação dos horários de trabalho, condições fundamentais para a decisão de ter filhos.

Quanto ao chamado IRS jovem – uma das medidas emblemáticas desta Proposta, colocada também no objectivo de inversão da tendência demográfica – trará sem dúvida benefícios, ainda que limitados, aos que forem abrangidos pela medida, mas por outro lado poderá inserir-se na linha indiciada no projectado acordo para a competitividade e rendimentos, apresentado em sede de concertação social, em que o reforço dos rendimentos não salariais aparece como forma de compensar ou substituir os aumentos salariais que o patronato procura condicionar, inclusivamente recorrendo à ameaça da caducidade dos contratos colectivos e bloqueando, assim, a negociação colectiva.

Por tudo isto, no entender da CGTP, não estamos perante um orçamento de continuidade, como o Governo se tem esforçado por fazer crer, mas sim perante um Orçamento muito mais virado para a contenção da despesa e a obsessão de um excedente orçamental, do que com a realização dos investimentos de que o pais precisa nos planos da economia, dos serviços públicos e funções sociais do Estado, na distribuição da riqueza e no combate às desigualdades.

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