Carta Aberta sobre a realização da reunião do Conselho Europeu

cosnseuroA CGTP-IN enviou ao Primeiro-Ministro, António Costa, uma Carta Aberta sobre a realização da reunião do Conselho Europeu no dia de amanhã, 19 de Junho.

Esta iniciativa é inserida na acção desenvolvida pelos sindicatos Europeus filiados na Confederação Europeia de Sindicatos.

Divulgamos o conteúdo da carta:

“Vivemos um momento de grande complexidade no nosso país e no mundo. A actual situação de pandemia inspira cuidados a todos, mas requer de forma particular que cuidemos da saúde e dos direitos dos trabalhadores, aqueles que, como se constata, estão a ser golpeados por ela de forma mais dura.

O surto epidémico evidenciou os constrangimentos que a União Europeia (UE) coloca aos estados-membros, no plano do investimento público, da produção nacional e do emprego, aprofundando de forma inaceitável a política de baixos salários e de trabalho precário que marca a vida dos trabalhadores.

A resposta da União Europeia não inverte esse caminho. Não se vislumbram medidas decisivas no plano ambiental, nomeadamente o estímulo à produção e ao consumo locais e à soberania alimentar, com impacto na criação de emprego e no desenvolvimento sustentável do país, em detrimento dos actuais padrões de produção, comércio e consumo assentes na liberalização do investimento e comércio, dentro e fora da UE, os quais continuarão a degradar os solos, a qualidade da água e do ar. Nem inverte um caminho de mercantilização da natureza, que não a protege e aumenta os custos para a população. Em relação à «transição digital», sem o controlo público dos sectores estratégicos, incluindo os que utilizam de forma mais intensiva as tecnologias digitais, sem o combate à precariedade, a defesa e valorização da contratação colectiva e um caminho assente na defesa dos postos de trabalho e dos direitos, acentuar-se-á o rumo de desvalorização do trabalho e dos trabalhadores, transformando a aplicação do conhecimento científico e técnico numa fonte de submissão e exploração dos trabalhadores e não da sua liberdade e emancipação.

Além da natureza limitada dos montantes propostos para o Plano de Recuperação Europeu e do próximo Quadro Financeiro Plurianual da UE, um e outro apontam condicionamentos e imposições de «reformas» que, legitimamente, nos fazem temer pelo regresso da política de cortes nos salários, pensões e direitos de tão má memória para os trabalhadores e o povo português. Na opinião da CGTP-IN é necessário que Portugal defenda a atribuição das verbas a cada país na forma de subsídios e não de empréstimos. Que sejam rejeitadas as condicionalidades e imposições associadas à utilização dessas verbas, em particular as que perpetuem a precariedade, os baixos salários, a perda de direitos e rendimentos dos trabalhadores. Portugal deve bater-se para que na repartição de verbas seja dada prioridade aos países de economias mais frágeis, e que sejam concentradas no investimento público, no aumento da produção nacional dos países deficitários, na manutenção e criação de emprego com direitos, nos serviços públicos e funções sociais do estado.

Este caminho alternativo e solidário teria tantos mais efeitos positivos nas condições de trabalho e de vida dos portugueses e de todos os povos da Europa se associado à revogação do Pacto de Estabilidade, da Governação Económica e do Tratado Orçamental e sobretudo à recuperação da soberania monetária de países como o nosso.

Por outro lado, na nossa opinião, o financiamento do Plano de Recuperação através de impostos europeus é uma opção que não defende os direitos e interesses dos trabalhadores, uma vez que retira parte da soberania fiscal e orçamental dos estados, perdendo parte das fontes actuais e potenciais de receita. A alternativa justa e solidária, tanto para o financiamento do Plano de Recuperação como do próximo Quadro Financeiro Plurianual, seria aumentar o contributo financeiro dos estados mais beneficiados com o processo de integração e em particular com o Euro.

Uma resposta sustentável contra a crise, e a capacidade de enfrentar outras que, por este caminho, irão surgir, será tão mais forte quanto dê uma resposta cabal aos problemas dos trabalhadores, aumentando os seus direitos, indo ao encontro dos seus anseios. No imediato, todos os esforços nacionais e da UE devem ser concentrados em assegurar a totalidade dos salários, a protecção da saúde dos trabalhadores e a defesa do emprego e dos postos de trabalho. Nas medidas de retoma, é necessário um verdadeiro investimento público e de dinamização da produção nacional; a renegociação da dívida nos seus prazos, montantes e juros; uma verdadeira justiça fiscal para uma mais justa repartição da riqueza; o reforço da qualificação e formação profissional; a garantia da estabilidade dos vínculos de trabalho e um verdadeiro combate à precariedade e ao desemprego; e o aumento geral dos salários, com a efectivação do direito de contratação colectiva, valorizando o trabalho e os trabalhadores.”

DIF/CGTP-IN

Lisboa, 18.06.2020